José de Anchieta (1534 - 1597)
No século XVI, a Companhia de Jesus era uma ordem da Igreja Católica que concentrava esforços na expansão da doutrina católica às terras de além-mar (as colônias), empenhando-se também na conversão religiosa dos nativos das colônias. No Brasil, uma das figuras mais proeminentes deste quadro histórico foi, sem dúvida, José de Anchieta. Nascido em 1534 em La Laguna de Tenerife, nas Ilhas Canárias, realizou seus estudos na Universidade de Coimbra, formando-se em meio à tradição humanística que caracterizava a época.
Anchieta, portanto, aprofundou seus estudos em Latim, Vernáculo, Letras, Dialética e Filosofia. José de Anchieta chegou ao território brasileiro em 1553, na missão de auxílio ao superior da Companhia de Jesus, o Padre Manuel da Nóbrega. Este se empenhava na fundação de um colégio no planalto de Piratininga, a região originária da cidade de São Paulo. Anchieta dedicou-se, então, à alfabetização dos filhos dos colonos e dos índios. Foi então o primeiro mestre brasileiro. Aos vinte e cinco anos tornou-se reitor do Colégio de São Vicente, e, dezoito anos mais tarde, transferiu-se para a Casa do Espírito Santo, falecendo em Reritiba, aos sessenta e três anos de idade, em 1597.
A importância do Padre Anchieta no quadro histórico e cultural da época pode ser considerada em dois aspectos principais: suas missões de catequese, no que toca a realização de uma obra social, e a sua obra literária, vinculada ao zelo pela expansão da fé cristã. José de Anchieta é tido como um símbolo da catequese no Brasil, recebendo então o cognome de "Apóstolo do Brasil". Sua habilidade com a língua dos indígenas lhe permitiu conhecer seus costumes e sua cultura. Este fato refletiu-se diretamente no seu modo de doutrinação dos indígenas pois, em seus textos, encontramos uma espécie de sincretismo entre a doutrina católica e o sistema de costumes e crenças indígenas.
Outro aspecto das lições do Padre Anchieta aos índios é a utilização de recursos cênicos para o aprendizado da doutrina católica. José de Anchieta preferia a riqueza de linguagem da poesia e das encenações às lições convencionais. Anchieta seguia princípios que tornavam a lição mais agradável e, conseqüentemente, mais persuasiva. Eram utilizados os recursos do auto medieval em conjunto com os elementos estruturais da cultura indígena. Tal estrutura textual favorecia a própria compreensão das lições, incutindo a crença no espírito dos nativos.
Anchieta pode ser considerado, portanto, um pioneiro na vida intelectual e literária brasileira, pois seus textos destacavam-se dos demais devido ao fato de serem escritos para brasileiros. Os textos escritos anteriormente se limitavam à descrição do Brasil para os europeus. É o caso dos textos escritos por Pero Vaz de Caminha e Hans Staden. Mesmo que os textos anchietanos possuam vínculos com a cultura européia, verificados na formação de juízos morais assim como em Gil Vicente, já se verifica na poesia e no teatro anchietano certa cor local brasileira.
Grande parte dos textos anchietanos estão concentrados no volume Poesias, onde seus poemas são escritos em latim, português, castelhano e tupi. José de Anchieta também "inaugurou" a poesia lírica brasileira. Os poemas líricos anchietanos foram escritos conforme a "medida velha", constituindo-se de versos de inflexão espiritual e religiosa. Podem ser destacados os poemas “A Santa Inês”, “Ao Santíssimo Sacramento” e “De Beata Virgine Dei Matre Maria”. Os autos anchietanos sintetizam a concepção cristã do mundo.
Ao longo destes textos dramáticos, encontra-se presente a constante polarização entre Bem e Mal, personificados nas figuras de anjos e demônios e caracterizados nas situações de santidade e pecado, de prêmio e castigo. Estes conceitos, entre os quais o homem cristão trafega, eram transmitidos aos indígenas através de fortes elementos cênicos, com aparições terríveis de demônios e com a pacificação do ambiente através das aparições de anjos. Anchieta utilizava o elemento catártico como meio de empatia para a conversão dos nativos, o que não seria viável através de uma mera transmissão verbal da doutrina religiosa.
Todos os elementos da doutrina cristã eram adaptados aos elementos correspondentes da cultura indígena. José de Anchieta pode ser considerado, praticamente, como um fundador de uma literatura nacional. Os modelos europeus ainda estavam presentes, mas dado o laborioso estudo da cultura e dos costumes locais dos indígenas, que até frutificaram na produção, por Anchieta, de uma gramática tupi (Gramática da Língua Mais Falada no Litoral do Brasil), resultaram já no início da criação de um "estilo" literário tipicamente brasileiro.
Ver autores de Literatura de Informação sobre o Brasil e Literatura dos Jesuítas
Obra:
José de Anchieta - Auto representado na festa de São Lourenço (93K) (pdf)
Feitos de Mem de Sá (zip)